domingo, 20 de outubro de 2013

[ORIGINAL]Recomeçar

                                                Recomeçar por Ane Viz

     Segurei minha mochila, apertando a alça dela, enquanto colocava a outra mão no bolso do meu agasalho. Um vento frio passou por mim me fazendo arrepiar. Puxei o casaco, querendo me proteger mais. Algumas pessoas passavam por mim com se eu não estivesse ali. Tiveram momentos em que levei algumas esbarradas, mas nada de um pedido de desculpas. Suspirei sabendo que precisava me acostumar, esse seria o meu novo lugar. Um diferente do que estou acostumada. Sorri fraco ao me lembrar de Roseiral e de minha  vida.
     Uma lágrima escorreu sem permissão por meu rosto quando a imagem de minha mãe apareceu em minha mente. O sorriso doce, o olhar carinhoso e o tom delicado de sua voz. Nunca vou me esquecer de minha melhor amiga. As horas que passávamos conversando, ou um gesto como um abraço me fazia ficar bem. Um nó em minha garganta me fez fechar os olhos, me forçando a secar as lágrimas com uma de minhas mãos, tentando impedir a dor de ter perdido alguém tão importante. Mesmo com minha vista embaçada pelo choro que insistia em rolar por meu rosto tentei me concentrar no que via.
     A minha frente, numa velocidade normal, vinha um ônibus, a visão estava ruim, porque meus olhos não estavam cooperando. Dei um passo para frente e consegui enxergar. Era a linha que me levaria para o lugar onde estava sendo forçada a morar. Coloquei uma mecha de meus cabelos pretos que caiu em meu rosto atrás da orelha. E joguei minha mochila em meu ombro, e fiz um sinal para pararem. Vi diminuir a velocidade e agradeci mentalmente, mas não sabia o quanto estava enganada. O motorista parou por um segundo e logo acelerou, me sujando com a água da poça. 


     -Argh! – Resmunguei. – Droga, droga!- Puxei o ar lentamente querendo me acalmar. – Odeio essa cidade!


Não era possível em menos de dois na cidade me sentia incrivelmente azarada. Em tão pouco tempo me meti em várias furadas e vi muita coisa ruim. Respirei fundo lentamente, desejando que tudo fosse um pesadelo e estivesse em minha cama para logo em seguida escutar a minha mãe me chamando para ir à escola. Mais uma vez minhas lágrimas vieram, e dessa vez não quis pará-las. Fiquei por vários minutos sentindo aos poucos as lágrimas pararem. E outro ônibus chegou e fiz a mesma coisa, dessa vez esperando que parasse.
     E felizmente assim aconteceu. Apressada, entrei ali, paguei, e me sentei, colocando a mochila sobre minhas pernas. Discretamente, abri um pedaço dela e olhei meu celular, querendo ver por quanto tempo estava ali. E me assustei ao ver que já era quatro e meia da tarde. Senti alguém sentar ao meu lado e me mexi desconfortável ao ver que estava me olhando de lado. Ergui meu rosto e o encarei. Ele riu, passando a mão por seus cabelos ruivos. E me estendeu a outra mão, num cumprimento mudo. Estudei seu rosto e aceitei o gesto.


     -Andrew, prazer. – Falou calmamente.



     -Jessica, prazer. –Respondi tirando a mão da sua.



     -Desculpe, mas... – Ele enrugou o cenho e completou. – Já não te conheço?



     Ri achando aquela pergunta engraçada e ele ficou sem jeito ao ver que tinha pensado que era uma indireta.



     -Não, não é isso. – Disse apressado, explicando. – Achei seu rosto é conhecido.



     -Hmm, eu não me lembro de você. – Sorri sem jeito. – Desculpe.

Voltei meu olhar para a janela e logo o ônibus estava parando no ponto que deveria ficar. Acenei para ele, colocando a mochila outra vez em meu ombro, e saí querendo chegar a casa dele. Tirei do bolso do meu casaco o papel onde tinha anotado o endereço, e vi que estava na rua certa. Olhei a minha volta e o lugar até parecia bonito. Talvez não fosse tão ruim morar ali. Comecei a caminha pela rua, observando as árvores que tinham por toda a calçada deixando o local mais bonito. Distraída com a paisagem não notei o que vinha a minha frente.
     Num instante estava de pé aproveitando a vista e na outra me via caída no chão com as costas doloridas, senti alguém segurar meu braço, me levantando com cuidado. Ergui meu rosto, pronta para falar mil e um desaforos por estar cansada dessa maldita cidade quando encontrei com os seus olhos. Era numa tonalidade diferente... Um verde acinzentado em contraste com seu cabelo loiro. A expressão em seu rosto era de preocupação e por pequeno segundo, quase me senti mal por isso. Balancei minha cabeça retomando o meu raciocínio.


     -Ei, olhe por onde, ok? – Soltei desviando meus olhos.



     -Er, desculpe, estava distraído. – Apontou para umas pastas que tinham em seu braço.



     Dei de ombros e comecei a me virar para continuar andando com uma sensação de que nem tudo estava perdido. Podia sentir os olhos dele me seguindo, enquanto eu continuava em direção a casa do meu pai. O que parecia ser o fim de tudo agora não era tão assustadoramente negativo. Minha intuição me dizia que poderia dar certo depois de tantos problemas. Via a chance de ser feliz novamente. Sorri diante da expectativa de ter outra vez a paz que desde aquele dia me fora tirada. Essa cidade, de certa forma, era a oportunidade de recomeçar.


                   Fim 

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